sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Ciência versus Religião, uma luta inglória pela Verdade


Quando começou o desgaste entre essas duas “instituições” humanos não é possível precisar, poucas informações se têm desse conflito na antiguidade, no entanto, desde a queda do império romano até o renascimento, que marcou o fim da idade média, esta contenda esteve arrefecida por vários séculos, a partir da publicação do estudo do Doutor em direito, astrônomo e padre Nicolau Copérnico, em 1543, a teoria heliocêntrica,  algumas entidades religiosas começaram a sentir desafiadas, ultrajadas, ou melhor, ameaçadas pelas novas verdades que afloravam das descobertas dos homens. A discordância entre essas partes prossegue desde então, cada uma a sua maneira vem tentando, nem sempre com diplomacia, administrar o assunto delicado, muitos eventos foram marcados e ainda são, por penas cruéis ou execuções impostas aos que ousaram falar a verdade ou discordar da Palavra, por vezes, plasmados nos arroubos de estupidez de uma ou ambas as partes, contudo,  uma tem a seu a favor a pureza da verdade consubstanciada na realidade do fatos, enquanto a outra se reveste de afirmações duvidosas e de uma autenticidade que jamais poderá ser legitimada, o agnóstico Marcelo Gleiser,  Phd em física e autor, escreveu em um de seus artigos:  “Se contrastarmos explicações míticas e científicas da realidade, podemos dizer que mitos religiosos procuram explicar o desconhecido com o "desconhecível", enquanto que a ciência procura explicar o desconhecido com o "conhecível"”.

O pomo da discórdia talvez resida no fato de que uma está assentada sobre a verdade sólida, corroborada pela experiência, se mantidas suas características originais, o experimento pode ser repetido indefinidamente obtendo sempre o mesmo resultado, a comprovação inconteste da verdade ali contida, a outra, ao contrário, se fundamenta na verdade dogmática, conflituosa e questionável, cuja veracidade é impossível de ser comprovada tal a incompatibilidade de versões sobre o assunto que versa, cada uma possui diferentes versões sobre a origem do universo, do homem e seu comportamento, mudando de postura de acordo com a conveniência de cada crença, constroem a babel de contrariedades onde ninguém se entende ou é capaz admitir sua debilidade, fazendo com que estas afirmações padeçam do descrédito, vítimas das próprias contradições que lhe são inerentes, carecem, portanto, de uma unanimidade irrefutável, algo  que avalizasse tais afirmações, coisa que no mínimo consolidaria a unidade em torno do Criador.

Desamparados pela solidez da verdade argumentam que as escrituras sagradas não poderiam ter sido escritas pela mão do homem, e sim sob a luz da inspiração divina, se Deus é Uno, pergunta-se, onde está a unidade? Porque os ensinamentos trazidos por cada profeta não convergem em um único livro sagrado?  Por que a divergência com outros se a fonte da sabedoria é a mesma?  A alegação que foram escritos em épocas diferentes agrava ainda mais a situação, porque para o Eterno a dimensão do tempo é irrelevante. A vacuidade dessa justificativa e a mesma dos outros argumentos, sempre respaldados na retórica contraditória dessa pretensa verdade e na impostura dos ensinamentos sagrados, coisa que demonstra o quanto subestimam a si próprios, admitindo seu complexo de inferioridade perante a maior dadiva concedida à criatura humana depois da vida, uma prerrogativa que a torna única, a capacidade de pensar, que faculta ao homem criar, existir e, sobretudo, evoluir.  Quem sabe quanto pode o homem, senão seu próprio Criador?

Se bastasse isso, miremos nos exemplos, desde sempre as religiões se digladiam, cada uma se auto afirmando como detentora da verdade, arrogando que a sua história constitui a verdade absoluta, suprema, aquela que é magna sobre todas as outras, expressas pelas palavras próprio criador. Execrando-se mutuamente nessa discussão vexatória acabam por negligenciar a importância do assunto tão elevado, enquanto os lados se acusam arvorando aos demais que seguem falsos profetas, denotam lamentavelmente a intolerância, a soberba e a vaidade que deveriam evitar. Cabe perguntar, que verdade é essa então? Existem várias versões para verdade?  Qual delas é a verdadeira? Provavelmente todas possuem elementos da verdade, propõem-se a fazer o bem e zelar pela moral e os bons costumes, desenvolvem uma função social ao suprir a ineficácia dos governos e a indiferença da sociedade humana, criam na mente dos crédulos a ilusão de que o infortúnio de sua condição faz parte de um desígnio superior que lhes  garantirá a felicidade eterna como recompensa, mas isso será suficiente? 

Se reconhecem a existência do Divino, sabem também que Ele está acima de todas as mesquinharias humanas, atribuir a um ser notável e Universal deficiências humanas, como a ira, ou pensar que o Criador é capaz de preterir uns em detrimento de outros, é blasfemar contra Deus, contradiz a natureza de sua benevolência infinita, negando o amor incondicional que lhe é intrínseco.

É assustador perceber que em pleno século XXI há quem utilize o nome de Deus para empreender cruzadas e guerras santas, que santidade pode haver numa luta entre irmãos, que insanidade fanática faz com que se imolem ou se suicidem tentando defender sua crença, embora estes casos façam parte das exceções e não da maioria, são reveladores e evidenciam a escuridão que se abate sobre os homens subjugados pela credulidade, cegos, que ignoram o bom senso, a razão, o amor ao próximo e a própria vida em nome de uma causa vazia, seres que não aprenderam que a soberania Divina é maior que qualquer diferença religiosa.

Ao condenar a ciência com a intransigência que lhe é peculiar os crentes o fazem se esquecendo de que se valem dela para benefício próprio, ignorando as técnicas usadas para erigir a casa que vos abriga das inclemências da Mãe Natureza; das máquinas maravilhosas que os transportam através das terras, águas e também nos céus, como fizeram os mitológicos Dédalo e Ícaro; dos remédios “milagrosos” que permitem alcançar a cura, minimizando a dor dos enfermos, e salvando outros tantos da morte certa, prolongando a valiosa vida; das ferramentas da tecnologia que ampliam a comunicação entre os homens, permitindo que propaguem A Palavra para além dos oceanos em um âmbito nunca antes alcançado; são benesses da ciência. Não que ela seja perfeita, ao contrário, está cheia de imperfeições, pois ela é humana, portanto falha, sujeita às nossas deficiências. Infelizmente essa mesma ciência também é usada para o mal, para destruir e matar, mas como foi dito, ela é imperfeita, tal como os homens que dela se valem dela para tirar o proveito benévolo ou maléfico que possa ter, porém, se não fossem suas descobertas continuaríamos nas trevas, vivendo em cavernas como animais até os dias de hoje.

A ciência é humilde, ciente de sua inexatidão é capaz de adaptar-se as novas descobertas admitindo equívocos anteriores, sem condenar ou amaldiçoar aqueles que não concordam com seus postulados ou criticam seus erros, ao invés disso, reconhece no questionamento a possibilidade da evolução, distintamente, enxerga na reação não o desrespeito, mas a oportunidade do desafio de descobrir, estudar, aprender  e saber cada vez mais sobre o assunto pesquisado,  paciente, sabe que não pode se conformar  as limitações momentâneas do tecnologia humana; o pensador inglês Oscar Wilde afirmou:  “o progresso é a realização de utopias”, essa pequena frase enfatiza que através do conhecimento a ciência humana pode  progredir infinitamente, indo sempre além, contudo,  atenta aos obstáculos  e a fatalidade do insucesso, sem esmorecer na busca contínua para decifrar os mistérios do desconhecido.

O problema com alguns homens da ciência é o mesmo que aflige os sectários religiosos, a crença de que suas convicções científicas constituem a verdade. Ironicamente o ceticismo crônico de certos cientistas tem consequências danosas para seus anseios na busca pelo conhecimento, a negação deliberada do metafísico extirpa de suas vidas a esperança do significado de suas existências, reduz o viver ao materialismo inócuo que transforma homens em objetos, coisa que pouco ou nada acrescenta a criatura humana, deixando-se seduzir pelo valor efêmero das posses materiais, o pesquisador que sucumbe ao poder econômico afasta-se consequentemente da nobreza de sua missão e vende sua alma pela melhor oferta. O preconceito da negação de Tudo expressa de certa forma o medo instintivo do desconhecido e a fragilidade de sua razão, esse comportamento institui entre os meios científicos a Crença de Descrença, colocando em xeque sua duvidosa racionalidade, mergulhando-os na mesma “sopa” de arbitrariedades de outros crédulos que tanto criticam.

É muito cômodo para homem crer ou descrer. 

A credulidade encontra principalmente na mente dos ingênuos um campo fértil para se instalar. Desprevenidos à falsidade e ao sofisma, vulneráveis, admitem como verdade tudo que lhe és “ensinado” sem se questionar porque o fazem, ficando a mercê da sugestão alheia, que depois de encrustada converte-se numa carapaça contra verdade. O outro lado da moeda é o conveniente ceticismo intelectual da descrença gratuita, que tende a rechaçar todo e qualquer argumento que esteja fora ou além do escopo da ciência humana, mesmo sem compreender a profundidade do que trata o assunto, refutam sem hesitar qualquer explicação que não se enquadre nos paradigmas acadêmicos, alijando a si mesmos a oportunidade de explorar e conhecer o novo. O pensador argentino Carlos Bernardo González Pecótche resumiu de maneira magistral essa controvérsia na seguinte frase: “A única concessão possível ao ato de crer, sem que se invalide em nada o exposto, é a que surge espontaneamente como antecipação do saber; noutras palavras, só se deverá admitir aquilo de que ainda não se tem conhecimento, mas durante o tempo mínimo requerido por sua verificação através da própria razão e sensibilidade”.

O impasse oriundo desse debate em torno do ceticismo científico fez com que dois cientistas estadunidenses publicassem no final do século passado seus estudos sobre o Princípio Antrópico Cosmológico que insinua a atuação de um ente superior na regência do equilíbrio cósmico, o primeiro foi Robert Dick, posteriormente Brandon Carter, que dividiu o trabalho e duas partes, o princípio fraco e o princípio forte, outros cientistas também seguiram a mesma linha de raciocínio estudando as duas teorias, que fez simpatizantes de ambos os lados, no entanto, o Princípio Antrópico Cosmológico forte se aproxima perigosamente do antropocentrismo, orbitando perigosamente próximo a convicções de caráter religioso que colocam o homem como razão de existir do universo, devido a essa proximidade o físico e astrônomo Carl Sagan o apelidou de “Princípio Antropogênico Cosmológico”. Caberão ao tempo e a ciência definir se o Princípio Antrópico Cosmológico poderá realmente elucidar suas interessantes implicações filosóficas e científicas, quem sabe trazendo alguma explicação satisfatória sobre os fenômenos que o incipiente conhecimento humano contemporâneo ainda não é capaz de esclarecer. 

O conhecimento provê aos homens a confiança em si mesmos, requisito principal para superar conscientemente seus medos e frustrações, possibilita a ele realizar suas escolhas à luz da razão compreendendo a importância dos valores morais, éticos e sociais, refletindo antes de agir, ser consciente de suas atitudes e do porquê de sua mudança, acima de tudo, ciente que o faz por vontade própria e não por uma imposição doutrinária.

É um ledo engano presumir que a verdade possa ser contida, envasada, a Verdade é incontinente, a magnitude da verdade não pode ser confinada, parametrizada, condicionada, ou doutrinada, não importa o meio ou o instrumento, seja pela ciência ou pelas crenças, ao querer restringir a verdade o homem opta por reduzir o alcance de seu conhecimento conformando-se com o as imposições dos limites que lhe subtraem o saber, quando este domo invisível paira sobre a consciência humana, pode turvar-lhe a visão, impedindo-o de enxergar a vastidão de um horizonte ilimitado, sem fronteiras, repleto de verdades aguardando por serem descobertas por aqueles que se atreverem a pensar com liberdade. 

Em 1929 o pensador Indiano Jiddu Krishnamurti pronunciou pelo rádio, para seus ouvintes, os motivos da dissolução de sua Ordem, dizendo: "Sustento que a Verdade é uma terra sem caminhos, e vocês não podem aproximar-se dela por nenhum caminho, por nenhuma religião, por nenhuma seita. Este é meu ponto de vista e eu o sigo absoluta e incondicionalmente... Se compreenderem isso em primeiro lugar, verão que é impossível organizar uma crença. A crença é uma questão puramente individual, e não podemos nem devemos organizá-la. Se assim o fizermos, ela morrerá, ficará cristalizada; tornar-se-á um credo, uma seita, uma religião para ser imposta aos outros. É isso o que todos no mundo inteiro estão tentando fazer! “.  Refletindo sobre a mensagem acima e razoável pensar que talvez ele tenha razão ao perceber que não existem caminhos para verdade, a verdade é o caminho.

Como já foi enfatizado antes por vários sábios, a acesso verdade não é vedado a ninguém, o caminho da verdade pode e deve ser trilhado individualmente, tutelado pela própria consciência, cada um ao seu tempo, mas mesmo aqueles que se encontram amparados pela muleta das crenças ou o ceticismo da ciência também estão predestinados a encontrá-la mais cedo ou mais tarde, através da unidade com o Criador, direito adquirido por todo ser consciente que lhe é outorgado pela morte.

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